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Gradiente de conhecimento

 

Gradientes de Conhecimento


Os métodos de planejamento sistemático em conservação necessitam de uma razoável qualidade dos dados. Entretanto, o conhecimento sobre a biodiversidade permanece com algumas “falhas” (shortfalls, Lomolino 2004, Whittaker et al. 2005), já que a maior parte das espécies que existem no globo terrestre não foi cientificamente descrita, gerando a chamada “Falha Linneana”. Além disso, mesmo para as espécies que já foram descritas existem poucos dados sobre a sua distribuição geográfica, o que constitui a chamada “Falha Wallaceana”. Os padrões da ocupação humana podem expressar também variações espacialmente estruturadas no nível de conhecimento sobre a biodiversidade, o que pode gerar correlações entre riqueza de espécies e o nível de ocupação da população humana (ver seção “Conflitos de Conservação” acima). No caso do Cerrado, essa possibilidade é parcialmente confirmada pela correlação significativa entre riqueza de espécies de anfíbios e população humana. Uma maneira interessante de avaliar o conhecimento sobre um grupo é por meio de uma análise das datas de descrição das espécies. Para os anfíbios do Cerrado, por exemplo, há correlações significativas entre as datas de descrição e área de distribuição geográfica e tamanho do corpo. Assim, as espécies recentemente descritas apresentam menores tamanhos corpóreos e distribuições geográficas restritas e, em geral, são endêmicas ao Cerrado (para detalhes ver Diniz-Filho et al. 2005). Essas análises mostram que os padrões de diversidade dos anfíbios no bioma estão enviesados pelo grau de conhecimento que existe sobre o grupo. A pergunta, portanto, é: como a descoberta de novas espécies poderia afetar em um sistema de unidades de conservação pré-existente (ou idealizado com base nos dados atuais)?
Bini et al. (2006) propuseram uma maneira de minimizar os efeitos das falhas de Linnaeus e de Wallace, através da simulação das distribuições geográficas de espécies de anuros. De acordo com a taxa de descrição de novas espécies de anuros, o número de espécies descritas para o bioma se estabilizaria no ano de 2050 com um total de 160 espécies (ver Diniz-Filho et al. 2005). Sabendo que já existem 131 espécies de anuros descritas para o Cerrado, existem, pode-se hipotetizar que há 29 espécies desconhecidas. Partiu-se do pressuposto que estas espécies “hipotéticas” deveriam ocorrer em regiões menos estudadas e, por se tratar de espécies ainda não-descritas, estas apresentariam distribuições geográficas restritas (e pequeno tamanho corpóreo). Foram propostos três tipos de modelos para simular a distribuição dessas espécies, levando em consideração (i) apenas o nível de conhecimento sobre a diversidade biológica da região; ii) incorporando, junto ao nível de conhecimento, uma variável que traduz uma medida de adequação da célula para ocupação por anfibios (ou suitability). Nesse modelo ii, definiu-se que essa adequação seria expressa pela disponibilidade de energia (TEMP) ou pela disponibilidade tanto de água quanto energia, indicada pela evapotranspiração anual total (AET). De acordo com o padrão espacial das distribuições das espécies hipotéticas, combinada com o padrão das espécies já descritas, na região do Cerrado, estabeleceram-se áreas que apresentaram regiões de importância para a conservação, em termos de insubstituibilidade (seguindo a mesma metodologia proposta na seção de “Complementaridade e Insubstituibilidade”). Observou-se que a descrição dessas novas espécies deve levar a um aumento no número de regiões prioritárias para conservação no norte do Bioma.
Possingham et al. (2007) discutiram recentemente uma série de pontos importantes em relação às análises apresentadas por Bini et al. (2006). Em primeiro lugar, eles sugerem que essas indicações de insubstituibilidades de áreas, de acordo com a presença de espécies hipotéticas, podem ser interpretadas de maneiras alternativas, uma delas é que a região Norte do Cerrado (com o menor nível de conhecimento sobre a biodiversidade de anuros) necessita de mais esforços de coleta, ou necessariamente de pesquisa. Outra possível interpretação é que as regiões de menor conhecimento de biodiversidade podem ser, por definição, alvos de ações conservacionistas imediatas definido as falhas de Wallace e Linnaeus.

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